A peste suína africana, doença que em 2018 avançou com força sobre o imenso plantel chinês (estimado em cerca de 700 milhões de animais), ajudou evitar uma crise na suinocultura brasileira. E alimenta agora a esperança de que o Estado volte ao patamar de exportações alcançado em 2017, quando quase US$ 500 milhões em carne suína foram embarcados para o exterior. Em 2018, esse valor caiu 42%, ficando em US$ 285 milhões. No final de 2017, a Rússia deixou de comprar o produto do Brasil, mas, para sorte dos suinocultores gaúchos, quase ao mesmo tempo a China passou a importar uma quantidade elevada para garantir o abastecimento de seu mercado interno.

Como os russos compraram apenas do Rio Grande do Sul US$ 200 milhões em carnes e miudezas de suínos em 2017 e nada em 2018, O Estado teria um considerável baque nas contas sem a demanda chinesa. Assim, apetite chinês e avanço da peste no gigante asiático foram um alívio para os mais de 8 mil criadores gaúchos. Para se ter uma ideia da importância da entrada dos compradores chineses para o Brasil em meio ao entrave nas vendas à Rússia, basta comparar os volumes pelo gigante asiático antes depois do avanço da peste suína africana na Ásia.

Em 2017, a Rússia importou, no primeiro trimestre do ano, 70 mil toneladas de carne suína do Brasil. Em 2018, os russos nada adquiram por aqui. Já os chineses ajudaram a reduzir o baque. Entre 2017 e 2018, a China aumentou de 290 mil toneladas para 413 mil toneladas as aquisições no Brasil (incluindo Hong Kong, cujos dado são computados separadamente). Dos frigoríficos gaúchos as importações quase dobraram, passando de 46 mil toneladas para 78 mil toneladas, também somando os dois destinos. Apesar de os russos ainda não estarem comprado a totalidade do que adquiriam antes, estão ampliando gradativamente as aquisições. E ter dois grandes compradores juntos ajuda a elevar volumes e preços.

A alta de 10% nas vendas apenas para os dois países no primeiro trimestre de 2019 (US$ 58,7 milhões ante US$ 52,8 milhões de 2018) é um indicativo de que o setor irá ultrapassar os US$ 285 milhões totais exportados pelo setor em 2018. “Os valores já estão subindo devido a alta demanda. E não será difícil voltarmos aos quase US$ 500 milhões de 2017, um dos melhores resultados até hoje. Acredito até que podemos superar. Pelo cenário desenhado hoje, com os problemas na China, e pelo que indicam as projeções, é provável que isso seja alcançado”, anima-se o presidente da Associação dos Criadores de Suínos do Estado (Acsurs), Valdeci Folador. O ânimo justifica-se pelo tamanho do mercado chinês, especialmente.

Os chineses consomem mais de 50 milhões de toneladas de carne suína por ano, de acordo com a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), o que corresponde a metade de todo o consumo mundial do produto. Para o Rabobank, instituição financeira holandesa especializada em agronegócio, porém, é incerto tanto o futuro da demanda chinesa quanto os mercados que efetivamente serão beneficiados. Em relatório divulgado sobre o tema, o banco ponderou que quantidade de carne de porco que a China vai importar permanece incerto, assim como as atuais negociações comerciais EUA-China podem interferir nesse mercado, já que os criadores norte-americanos são tradicionais exportadores da carne.

Mas, de uma forma ou outra, o Brasil será beneficiado tanto pelo aquecimento da demanda externa quanto pelo mercado interno com a melhora na economia do país. Apesar de confiante sobre as vendas deste e do próximo anos, Folador não recomenda o aumento do plantel gaúcho no momento. “O que os produtores podem fazer, e tem feito, para ganhar com o atual momento é mandar para abate o animal mais pesado. Assim ganha mais com a venda da carne sem correr risco de ficar com animais demais caso o mercado se retraia”, diz o presidente da Acsurs.

Crescente demanda chinesa alimenta mercado mundial Dos cerca de 700 milhões de suínos criados tradicionalmente no país asiático, as estimativas apontam que cerca de 15% já tenham sido abatidos para tentar controlar os focos de peste suína Africana em diferentes províncias. Ou seja, o equivalente a 100 milhões de cabeças. Muitas vezes mais do que as cerca de 2 milhões de suínos criados anualmente no Brasil. De acordo com a Embrapa, a doença é de notificação obrigatória aos órgãos oficiais nacionais e internacionais de controle de saúde animal, caso ocorra no Brasil as consequências socioeconômicas são estimadas em US$ 5,5 bilhões. Apesar de livre da peste africana, Brasil deve ficar em alerta com contaminação Doença altamente contagiosa, a peste suína africana (PSA) não acomete os seres humanos, mas se alastra rapidamente entre os suídeos domésticos e asselvajados (como javalis), com elevado nível de letalidade, perda de peso do rebanho. Ou seja, acarreta grande impacto econômico quando não é identificada e controlada rapidamente. E já ocorreram dois surtos nos Brasil, que, até o momento, está isento de registros.

Em 1978 a doença entrou no Brasil possivelmente por meio de alimentação que sobrava de aviões e era utilizada para alimentar uma criação de suínos no Rio de Janeiro. “O maior risco está em portos e aeroportos, já que o vírus transita por meio de objetos, pessoas e alimentos”, alerta Luizinho Caron, pesquisador da Embrapa Entre 2006 e 2007 foi pelo mar, também em razão de alimentos contaminados que chegaram à Geórgia de navio, que uma nova onda da peste teria se alastrado em parte da Europa, segundo o pesquisador. Um dos riscos é o ingresso de alimentos não processados e com ossos, o que levou o Ministério da Agricultura a reforçar a fiscalização em portos e aeroportos brasileiros neste ano.

Em 16 de abril, a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e o Ministério da Agricultura começaram a formar um grupo de trabalho para definir ações que devem ajudar a manter o Brasil sem PSA. “Avançamos em pontos importantes na prevenção. O Brasil é livre da doença e quer reforçar sua blindagem sanitária para que o País fortaleça ainda mais a posição como porto seguro para o fornecimento de carne suína para o mundo”, diz Francisco Turra, presidente da ABPA.

Fonte: Jornal do Comércio