Principal insumo usado na alimentação animal, grão voltou a registrar alta de preços em meio a seca no Sul do país e chuvas no Centro-Oeste

A importação do milho e a ampliação do plantio de cereais de inverno não foram suficientes para conter os custos de produção animal no último ano. As medidas foram as principais atitudes adotadas pelo governo brasileiro e pelo próprio setor agropecuário para fazer frente a forte alta registrada nos preços do milho desde 2019.

Com mais uma temporada de seca em 2021/22, as perspectivas são de continuidade do cenário de margens apertadas ou negativas ao longo dos próximos meses, com previsão de queda na produção nacional de aves e suínos neste primeiro semestre.

“A contribuição dos cereais de inverno ainda é marginal considerando a grande demanda, da ordem de mais de 50 milhões de toneladas de milho, necessárias para a alimentação animal”, conta o presidente do Sindicato Nacional da Indústria de Alimentação Animal (Sindirações), Ariovaldo Zani. Segundo levantamento da Conab, enquanto a produção total de grãos na temporada 2020/21 apresentou queda de 1,8%, a safra de cereais de inverno somou 9,8 milhões de toneladas, volume 30% maior que o registrado no ano anterior. Desse total, 8,2 milhões de toneladas foram de trigo – resultado 31,4% superior.

“Houve um esforço muito grande no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina para estimular a produção de cereais de inverno. A produção no último ano foi substancialmente maior do que tradicionalmente vinha sendo e com uma qualidade bastante elevada. Mas do ponto de vista de oferta de matéria-prima para aves e suínos, isso não surtiu efeito porque a qualidade do trigo foi muito boa, abrindo perspectiva de exportação. Então, acabamos produzindo bastantes cereais de inverno, mas a maior parte desse volume foi exportada por um preço muito elevado”, explica o pesquisador da Embrapa Aves e Suínos, Everton Krabbe.

Em 2021, o Brasil exportou 1,13 milhão de toneladas de trigo, segundo números da Secretaria de Comércio Exterior compilados pelo Ministério da Agricultura, mais que o dobro do registrado em 2020 e o maior volume desde 2015. “A gente tem a aposta nos cereais de inverno, mas sempre condicionado ao mercado externo também. Então, não existe milagre. O mercado é aberto e o produtor vai comercializar e direcionar o produto dele para onde for mais rentável”, completa Krabbe.

Além das questões de mercado, a formulação da ração animal com o trigo tem particularidades em relação ao uso do milho, segundo explica o presidente do Sindirações. “Quando o trigo entra substituindo o milho, a gente tem que complementar com gordura vegetal, que vem, predominantemente, da produção de soja. Estamos vivendo já há algum tempo esse cenário, em que o preço do óleo de soja está num patamar alto porque a soja também está”, relata Zani.

A importação de milho, que teve impostos zerados no ano passado diante da escassez do grão no mercado interno, tampouco tem aliviado os custos para o produtor. “Na verdade, com o dólar alto, não está compensando. As grandes empresas conseguem fretar um navio de milho, mas na suinocultura independente não temos isso. O produtor compra pouco. É impossível fazer isso porque tem que pagar antecipado e ter tempo de descarregar. Há também a logística de distribuição que é ruim, então, não conseguimos montar um grupo e importar”, conta o produtor e presidente da Associação Catarinense de Criadores de Suínos (ACCS), Losivânio Lorenzi.

Krabbe, da Embrapa, ressalta que a flexibilização da importação de milho foi uma medida importante para o setor, pois contribuiu para conter a volatilidade nos preços praticados no mercado interno. Porém, do ponto de vista dos custos de produção, os efeitos foram limitados. “Estamos falando de um mundo globalizado e existe um preço internacional dos grãos que não vai fazer com que ele chegue aqui a custos muito mais baixos do que o que está sendo praticado no mercado interno”, observa o pesquisador. Em meio a mais uma temporada com seca e perdas nas lavouras de verão, ele destaca que a única esperança, neste momento, é a safrinha 2021/22 que será colhida no próximo semestre.

“Pelo jeito, este ano a gente caminha para um cenário parecido com o que aconteceu no ano passado, pelo menos, durante o primeiro semestre. Oxalá com uma supersafra em meados do ano e na hipótese de uma melhora econômica a gente tenha uma cadeia produtiva mais estimulada para alcançar a projeção que temos para 2022, que é de um avanço de pouco mais de 4% na demanda de ração. Mas esses são números de janeiro. Olhando o cenário em que estamos, parece cada vez mais difícil contabilizar esse crescimento”, completa o presidente do Sindirações.

Fonte: Revista Globo Rural