A recente interferência do governo chinês no mercado de commodities assustou o mercado na semana passada. O anúncio pesou sobre alguns preços, mesmo que de forma pontual, mas, como reforçou o economista Roberto Dumas Damas, professor do Insper e especialista em economia internacional, apenas reafirmou a força da demanda da nação asiática e esta tentativa de conter um pouco da especulação. Entre as principais mercadorias controladas estão as commodities metálicas – em especial cobre e minério de ferro – além do milho, também no foco do governo chinês.

“No último trimestre do ano passado a China cresceu muito. Trimestre a trimestre é possível ver que a China cresce cada vez menos, mas o que levamos em consideração é que para crescer 2%, ela precisou explodir em investimentos em infraestrutura. Apesar de não precisar tanto mais de infraestrutura e nem ativos imobiliários, você precisa mostrar um crescimento econômico porque a China é uma ditadura”, diz Dumas.

No entanto, ele ressalta que, da mesma forma, a alavancagem bancária do país asiático continua crescendo, hoje já próxima de 300%, enquanto o PIB continua crescendo, porém, de forma mais limitada do que em anos anteriores. Assim, é possível que haja, daqui em diante, menos investimentos em infraestrutura e mudar o foco.

“Acredito que no segundo semestre os preços do minério de ferro devem arrefecer porque a China volta ao ‘novo normal’. Ou seja, se voltar para ser cada vez mais uma economia de consumo. Então, em que pese que o minério de ferro possa arrefecer, a demanda por commodities agrícolas vai continuar muito forte”, afirma o economista.

O combustível para a demanda forte por commodities agrícolas tem sido composto pelas condições estruturais e conjunturais.

“Eles precisam aumentar o motor de crescimento do consumo, dando mais renda para o chinês, e o motivo conjuntural que é a Peste Suína Africana e que dizimou 350 milhões de cabeças de suínos. Assim, até eles reconstruírem isso, a demanda por proteína animal, grãos, milho, soja, segue forte. Então, a demanda por commodities agrícolas veio para ficar”, complementa o economista.

O governo do país que é o maior comprador global de commodities agrícolas tem dado diversos sinais de que vem trabalhando de forma a, safra a safra, reduzir sua dependência de importações de grãos e cereais. O resultado, todavia, é esperado para aparecer, efetivamente, somente no longo prazo.

Na semana passada, o Departamento de Desenvolvimento Agrícola da China divulgou um boletim informando que acredita que a nação asiática se aproxime da autossuficiência de grãos como trigo e arroz até 2025. A estimativa do estudo mostra a produção chinesa, no ano em questão, eleve sua produção para 692 milhões de toneladas. Em 2020, foram colhidas 669 milhões.

“A produção de grãos vai continuar crescendo e a segurança alimentar estará completamente garantida durante o período do 14º Plano Quinquenal”, disse o vice-presidente da Academia Chinesa de Ciências Agrícolas, Mei Xurong.

De outro lado, apesar do crescimento da produção, a importação de alguns grãos, entre eles o próprio trigo, tem crescido também de forma substancial. Números do USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) mostram que a projeção é de que a safra 2021/22 de trigo chinesa seja de 136 milhões de toneladas, enquanto as importações deverão registrar um volume de 10 milhões de toneladas, a segunda maior da história.

Para a soja, ao passo em que se estima uma colheita recorde de 19,6 milhões de toneladas nesta nova temporada – 8,3% a mais em relação à safra anterior -, as compras internacionais do país asiático para este ano comercial está estimada pelo USDA em 103 milhões de toneladas. Do mesmo modo, para o milho se estima uma produção de 268 milhões de toneladas no ano comercial 2021/22, com importações que podem alcançar 26 milhões de toneladas.

A questão da segurança alimentar para o governo chinês mais é, além e acima de tudo, questão de importâncias política e social. “Não se pode deixar escalar uma tensão social por falta de alimentos, e isso, de certa maneira, beneficia os produtores de commodities”, explica Roberto Dumas Damas.

A recuperação do plantel de suínos na China vinha trazendo um estímulo muito intenso, nos últimos meses, à demanda por soja e milho. Pelo cereal, as compras fortes continuaram – e vêm, inclusive, batendo recordes – enquanto pela soja perderam um pouco do ímpeto.

E parte desse movimento menos intenso tem sido reflexo, principalmente, de um sentimento de menos confiança na suinocultura chinesa neste momento. Apesar da demanda interna por carne suína continuar forte – com as importações batendo recordes – a oferta agora é maior.

“O aumento da retenção de matrizes, em algum momento, traria uma oferta maior de carnes, tem também as reservas do governo de carne congelada, que são, segundo o governo chinês, bem confortáveis, e as importações que mais que dobraram. Se soma tudo isso e há um aperto nas margens do suinocultor por lá”, explica Eduardo Vanin, analista de mercado da Agrinvest Commodities.

Assim, as indústrias chinesas de alimentação animal já vêm reduzindo seu percentual de farelo de soja em seus produtos, também atendendo à uma resolução apresentada pelo Ministério da Agricultura do país. Enquanto isso, as importações de outros cereais para a compensação dessa mudança já aumentam de forma consistentes, entre eles o próprio trigo, cevada e sorgo.

China X mercado financeiro global

Apesar de todo este cenário e dessa conjuntura clara para as commodities agrícolas, representantes do mercado financeiro internacional afirmam que já tem se mostrado mais difícil para a China “reinar” no mercado de commodities.

Em entrevista à Bloomberg, analistas do Goldman Sachs afirmam que a velocidade com a qual economias determinantes para o quadro global crescem faz com a que o gigante asiático já não seja mais o único “comprador ditando os preços”. A opinião foi compartilhada pelo líder também do Citigroup.

Fonte: Notícias Agrícolas com adaptações Suino.com