Não é sem motivo que o Dairy Vision é considerado um dos maiores eventos do setor no mundo. Nesta edição, as palestras trouxeram o que há de melhor em inovação em produtos e tendências do mercado lácteo. Essas questões foram debatidas principalmente durante o segundo dia do evento.

As dez tendências-chave para o setor lácteo foram resumidas na palestra de Joana Maricato, da New Nutrition Business, do Reino Unido. Reforçando o que já havia sido abordado em palestras anteriores, ela disse que os consumidores estão cada vez mais exigentes e a indústria está sofrendo para acompanhá-los. Isso ficou bastante evidente na seguinte frase apresentada: “Hoje, as marcas já não estão no controle. São como rolhas a flutuar no mar das vontades e necessidades dos consumidores, estes, que estão em constante mudança.”

Segundo a palestrante, as tendências de consumo são divididas em duas categorias: megatendências e tendências-chave. De acordo com Joana, a sustentabilidade é uma megatendência devido à grande preocupação por parte dos consumidores com o futuro do meio ambiente. Diante disso, todas as marcas têm que se atentar a incluir medidas sustentáveis em seus processos, desde a produção da matéria-prima utilizada até a embalagem.

A outra megatendência é a fragmentação de mercado, característica bastante evidente na indústria alimentícia. Como já mencionado em notas anteriores, a busca constante por informação leva as pessoas a criarem suas próprias convicções sobre consumo, o que gera uma proliferação de nichos de mercado. Pensando nisso, as marcas podem se destacar oferecendo produtos voltados especificamente para esses segmentos.

Um desses nichos são atletas e pessoas que demandam produtos com alto teor de proteínas. Essa tendência já está bastante difundida nos lácteos, sendo possível encontrar diversos derivados proteinados nas prateleiras.

A preocupação com saúde digestiva também está em alta. Joana citou principalmente o sucesso do leite de vacas a2a2, que pode ser a solução para alguns casos de alergia e que também é mais facilmente digerível. Além disso, outro exemplo importante dessa tendência são os produtos acrescidos de probióticos, que foram tema da palestra da Eve Martinet-Bareau, representante da DuPont.

Eve falou da importância dos probióticos para a saúde não apenas digestiva, mas para funções cognitivas, imunológicas, entre outras. Ela destacou ainda que os produtos lácteos são os que tem maior potencial para uso de probióticos, sobretudo os iogurtes, que são fonte de diversos outros nutrientes e extremamente versáteis, podendo ser incluídos em diversas refeições, para diferentes idades.

Ainda no contexto de saudabilidade, produtos com menos açúcar e com gorduras “boas” também têm sido bastante procurados. Contudo, a característica saudável não deve comprometer o sabor do produto e deve ser palatável.

Os estudos apontam também a procura por conveniência. Nesta tendência, entram aqueles produtos comercializados fracionadamente ou em “snacks”, ideais para o dia a dia e consumo em movimento e muitas vezes combinando lácteos com outros alimentos, como queijos e diferentes tipos de nozes. Além disso, outro conceito importante é o da permissibilidade, ou seja, as pessoas permitem-se consumir algo não tão saudável vez ou outra. Nesse sentido, também são importantes as embalagens com porções pequenas.

Informações sobre a proveniência da matéria-prima utilizada são uma das características mais procuradas pelos clientes. Como já mencionado em notas anteriores sobre o evento, a necessidade de produtos que “contêm histórias” é cada vez maior. Uma forma de garantir a rastreabilidade dos produtos é a utilização de block chain e a aplicação dessa tecnologia na indústria de alimentos foi o tema da palestra de Percival Lucena, da IBM.

Segundo ele, a ferramenta permite “criar uma história digital do produto para o consumidor”. Isso se dá pela emissão de um QR Code no primeiro processo realizado para a fabricação e comercialização do item e, à medida que este vai passando pelas demais etapas, novas informações vão sendo adicionadas. Essa estratégia permite evitar fraudes, observar tempo de prateleira, reutilização ilegal de embalagens, entre outras possibilidades. Além disso, o consumidor final, ao escanear o código com seu celular, ficará sabendo de toda a narrativa e processos por trás do que está adquirindo.

Além de produtos rastreáveis, o consumidor procura autenticidade. Uma forma de conferir essa propriedade é por meio da aplicação de tecnologia, como, por exemplo, Inteligência Artificial (IA) e Realidade Aumentada (RA). Estes foram os temas das palestras de José Anibal Ferreira, da ESPM Brasil e de Fernando Godoy, da Flex Interativa.

Segundo Godoy, a RA aplicada em embalagens de alimentos pode tanto permitir inserir mais informações sobre o produto, quanto torná-lo autêntico, proporcionando uma experiência positiva única ao consumidor. Essa estratégia pode ainda ser combinada com IA, abrindo um mundo de possibilidades e permitindo que a marca insira quaisquer informações desejadas no rótulo.

Mas não necessariamente a autenticidade deve vir por meio da tecnologia. Um exemplo disso é a marca de queijos Vermont, comercializada pela Pomerode Alimentos, empresa pertencente aos irmãos Bruno e Juliano Mendes, que também ministraram palestra no evento. Eles são os fundadores da cervejaria Eisenbahn e, há alguns anos, decidiram se aventurar pelo mundo dos queijos. Na palestra eles contaram como fizeram a transição da cerveja para o queijo e os principais desafios encontrados no setor.

A Vermont produz produtos finos artesanais, sendo algumas receitas estrangeiras e outras criadas pelos próprios fundadores da marca. Bruno destacou que, da mesma forma que ocorreu quando quiseram inovar com cervejas fortes, seus queijos ainda são estranhados por parte dos consumidores. Mas, segundo os irmãos, significa que estão no caminho certo para inovar e que o paladar dos brasileiros ainda precisa ser educado para saborear iguarias diferentes.

Por fim, um dos assuntos mais discutidos no momento e que também foi tema de palestra do evento são os alimentos plant based. Exemplificando esse segmento, Luiz Augusto Silva, Diretor da NotCo no Brasil, falou no Dairy Vision.

A NotCo produz alimentos que se assemelham aos produtos de origem animal a partir de plantas, utilizando um algoritmo que combina bases moleculares de diversos cultivares. Na semana passada, a empresa fez seu primeiro “batch” do produto NotMilk, que contém água, proteína de ervilha, açúcar, fibra de chicória, abacaxi, óleo de coco, óleo de girassol, aromas naturais, sal, repolho, vitamina D2, Vitamina B12, Fosfato dipotássico, fosfato de cálcio, goma arábica, goma gelana e EDTA. Segundo Luiz, a intenção da NotCo é simplificar a cadeia de alimentação, utilizando plantas para alimentar pessoas, ao invés de alimentar animais que, por fim, alimentarão pessoas. O tema gerou diversos questionamentos oriundos da plateia, composta majoritariamente por representantes do setor lácteo, que acreditam que esse mercado será de nicho, mas que o setor de proteína animal terá que conviver com essas novas opções daqui para frente.

Fonte: Senar (Milkpoint)