O dólar disparou nesta terça-feira, registrando a maior alta diária em quase dez meses e cruzando a linha dos 5,20 reais, na máxima desde maio. A cotação foi alavancada pelo rali global da moeda norte-americana, em meio ao tombo nas commodities, e por dúvidas sobre a política monetária brasileira e consequências eventuais do tensionado ambiente em Brasília.

A pressão sobre o câmbio tem se intensificado – as altas diárias nas cinco sessões anteriores ficaram entre 0,15% e 1,37%. O dólar emendou a sexta alta consecutiva, mais longa série do tipo desde junho do ano passado.

Nesta terça, a moeda negociada no mercado à vista subiu 2,40%, a 5,2106 reais na venda. O ganho percentual é o mais forte desde 18 de setembro de 2020 (+2,77%). O patamar é o mais elevado desde 31 de maio (5,2254 reais).

Ao longo deste pregão, a cotação variou de 5,0757 reais (-0,25%) e 5,2135 reais (+2,46%).

O dólar tinha um amplo rali, ganhando contra 30 de uma lista de 33 pares. O índice da moeda norte-americana subia 0,3% no fim da tarde, chegando a se aproximar de máximas em três meses. O mercado está em ampla expectativa pela divulgação na quarta-feira da ata da última reunião de política monetária do banco central dos Estados Unidos, que pode trazer pistas sobre possível redução de estímulos ou alta de juros por lá.

Robin Brooks, economista-chefe do Instituto de Finanças Internacionais (IIF, na sigla em inglês), disse que dados mais fracos nos EUA geraram nesta terça-feira temor sobre o ritmo de crescimento da economia global, o que pesou sobre ativos emergentes. Mas ele considera esse receio uma “bobagem” e citou que o PIB norte-americano segue em expansão e que a política acomodatícia do Fed prossegue.

“A maior bobagem de todas é a queda acentuada do real. Nosso valor justo para a moeda continua em 4,50 por dólar”, disse Brooks em comentário no Twitter.

O real teve o pior desempenho global nesta sessão e encabeçou uma lista de perdas liderada sobretudo por moedas de commodities (assim como a brasileira).

O índice CRB de matéria-primas caiu 2,2% nesta terça, sob peso do tombo do petróleo, depois que as discussões da Opep+ fracassaram sem um acordo ou uma data para novas negociações. A queda das commodities foi reflexo também de temores econômicos relacionados à disseminação da cepa Delta do novo coronavírus.

Veja o gráfico da taxa de câmbio dólar/real (invertido) e do índice de commodities (em laranja) nesta terça:

Mais recentemente, o real conseguiu se beneficiar da escalada das matérias-primas, a qual por sua vez impulsionou os termos de troca do Brasil e colocou os saldos na balança comercial doméstica em recordes.

De forma geral, depois da forte queda de 14,9% do dólar entre uma máxima do fim de março (5,7681 reais) e a mínima recente de junho (4,9062 reais), alguns investidores veem certa exaustão no movimento, dado o maior nível de risco atrelado ao real –aumentado agora com a tensão do lado político.

Um ponto que entrou no radar dos agentes é o risco de o Banco Central não conseguir ser tão agressivo na normalização da política monetária quanto o desejado pelos agentes financeiros. Isso implicaria juros mais baixos do que o esperado e, assim, menor retorno relativo oferecido pelo real –justamente quando outros mercados emergentes começam a subir juros por temor de que o Fed em breve retire dólares do sistema.

“Há uma percepção que o Bacen está amarrado, porque não poderá subir muito os juros para acompanhar o Fed”, disse o profissional da área de câmbio de um banco estrangeiro, citando ociosidade na economia e desemprego ainda elevados. Segundo ele, fundos locais tem desfeito posições vendidas em dólar, ação que ocorre via compra de moeda.

Estrategistas do Morgan Stanley passaram a ter visão “neutra” para a taxa de câmbio, por entenderem que as posições favoráveis ao real parecem agora “esticadas” depois de meses de valorização da divisa brasileira. Um dos pontos citados é justamente a percepção de que a barra para surpresas “hawkish” (pró-elevação de juros) por parte do Banco Central está alta.

“Dessa forma, embora o ciclo de alta (de juros) em curso deva continuar a fornecer suporte para o real, achamos que o carregado posicionamento comprado e um dólar potencialmente mais forte (no mundo) podem desencadear alguma retração da moeda (brasileira) no curto prazo”, disseram os estrategistas em relatório.

Fonte: Reuters