O projeto que dispõe sobre a Política Nacional de Fauna apresentado na Câmara dos Deputados pelo parlamentar federal Valdir Colatto, no fim do ano passado, recebeu total apoio da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Santa Catarina (FAESC). Um dos objetivos do projeto é conter espécies exóticas invasoras que oferecem risco ao ecossistema, como o javali europeu.

“O javali tornou-se um tormento para os produtores rurais porque destrói as plantações e ameaça a vida das pessoas que trabalham na área rural”, resumiu o presidente da FAESC José Zeferino Pedrozo.

Na fundamentação do projeto está a constatação de que os animais exóticos formam populações fora de seu sistema e representam ameaças ao meio ambiente, causam enormes prejuízos à economia, à biodiversidade e aos ecossistemas naturais. São consideradas a segunda maior causa de perda de biodiversidade e de culturas agrícolas. As perdas econômicas decorrentes das invasões biológicas nas culturas, pastagens e nas áreas de florestas são imensas.

Pedrozo destacou que os perigos à saúde humana são elevados. Cita os resultados do estudo, que tem apoio da FAPESP, publicados na revista Frontiers in Ecology and the Environment de autoria do professor Mauro Galetti do Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro, do seu doutorando Felipe Pedrosa, da bióloga Alexine Keuroghlian da Wildlife Conservation Society (Brasil) e do professor Ivan Sazima colaborador do Museu de Zoologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

A pesquisa concluiu que a relação entre javalis e morcegos é muito preocupante. A quantidade de morcegos-vampiros, que transmitem raiva e preocupam agropecuaristas, pode aumentar no Brasil e nas Américas por conta do crescimento das populações do javali. Os pesquisadores constataram um aumento alarmante na distribuição e no número de javalis e porcos ferais. Além disso, demonstraram que os morcegos-vampiros (Desmodus rotundus) passaram a se alimentar do sangue destes porcos.

Das cerca de 1.200 espécies de morcegos no planeta, apenas três – todas das Américas – alimentam-se exclusivamente de sangue. Desmodus rotundus é a espécie de vampiro com maior distribuição, habitando um território que vai do México até a Argentina. O animal busca principalmente sangue do gado, mas há casos documentados de predação também de fauna nativa, como antas e veados.

Na Mata Atlântica (que inclui Santa Catarina), cerca de 1,4% dos morcegos-vampiros apresenta o vírus da raiva. A transmissão de raiva por vampiros é uma das maiores preocupações dos pecuaristas no Brasil, mesmo nas regiões onde o gado é vacinado. Mas animais selvagens, o que inclui os porcos ferais, não são vacinados, criando um potencial elevado de disseminação da doença.

O vírus da raiva é transmitido por meio da saliva de morcegos. O vampiro D. rotundus é também reservatório de outros vírus com potencial epidemiológico, como o hantavírus e o coronavírus. Os morcegos-vampiros gostam muito do sangue dos porcos e passar do porco doméstico para o feral e o javali deve ter sido simples para um animal adaptável como o vampiro. Porcos ferais ou javaporcos são animais resultantes do cruzamento entre javalis, uma espécie selvagem europeia, com suínos desgarrados de fazendas no Brasil.

FERA AMEAÇADORA

Os javaporcos aliam a ferocidade dos javalis com as dimensões e a fertilidade do porco doméstico, animal selecionado para fornecer mais carne e crias do que seu ancestral selvagem. Um javali macho adulto chega a 100 quilos. Um javaporco pode ter mais de 150 quilos e reproduz constantemente.

O Brasil enfrenta uma invasão de javalis e javaporcos sem precedentes na zona rural, com aumento de 500% desde 2007. Em 1989, javalis ferais no Uruguai começaram a cruzar a fronteira com o Rio Grande do Sul do Brasil. Foi o início da infestação que se alastrou para o território catarinense, atingindo as regiões da serra e do meio-oeste. Javalis e demais suídeos (porcos) em estado asselvajado são considerados uma das piores espécies exóticas do mundo, destacam os pesquisadores.

Os javaporcos andam em bandos, são agressivos e muito perigosos. Como o javali (e o javaporco) é considerado uma espécie nociva à fauna brasileira, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) liberou a caça ao animal em território nacional desde 2013.

A FAESC alertou que o problema não se limita apenas a porcos. Os animais nativos que são mordidos por morcegos-vampiros, como antas, veados e capivaras, carregam a ameaça potencial de transmissão de outras doenças virais existentes nos javalis.

MB Comunicação Empresarial/Organizacional