Depois de quase vinte anos, de volta à presidência da Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócios, entidade da qual foi um dos fundadores, José Luiz Tejon Megido é o que se pode chamar de o homem certo no lugar certo. Poucas pessoas, como ele, estudaram tanto o marketing na atividade rural e batalharam pelo seu fomento.

Nesta entrevista, ele faz um balanço da atividade no Brasil.

Mercado Global: Como o senhor resumiria a situação atual do marketing rural no Brasil?
José Luiz Tejon Megido: Ainda é preciso desenvolver o marketing para o produtor, que por sua vez, já tem padrão internacional.
O Brasil segue sendo um grande produtor agrícola e é aquele que indiscutivelmente, tem as melhores e mais duradouras perspectivas de crescimento do agronegócio, mas visto em seu conjunto, trata-se de uma atividade na qual há ainda pouco valor. Somos competentes – e cada vez mais – no agronegócio da escala e da logística, mas ainda órfãos no agronegócio do marketing.

MG: Falta a marca Brasil?
Tejon: Sim, mas não estamos no zero. Os segmentos mais organizados já perceberam que sem marca – que seria o produto mais notável da aplicação das técnicas de marketing ao agronegócio, eles são apenas produtores de commodities que, historicamente proporcionam margens cada vez mais estreitas aos produtores. Já com uma marca cria-se valor, ou seja, mais barreiras competitivas e retorno pelo investimento.

MG: Porque falharam as tentativas de se estabelecer marcas brasileiras em produtos vindos do campo, assim como se conseguiu com o Café da Colômbia?
Tejon: Primeiro é importante dizer que este não é um trabalho fácil nem rápido. Você citou o Café da Colômbia e é sabido que a construção desta marca demandou investimentos de US$ 2 bilhões e décadas de trabalho árduo e contínuo. E esta é também a sua resposta. Não temos uma marca Café do Brasil, Açúcar do Brasil, Frutas do Brasil etc. porque nunca nos dispusemos a trabalhar vinte anos seguidos por ela, tampouco investir tanto dinheiro.

MG: Falta visão de longo prazo?
Tejon: Pessoalmente acho que esta fraqueza específica do marketing rural decorre de uma das características mais importantes do agronegócio brasileiro, ao lado do excelente dos seus profissionais e da capacidade e competência dos fornecedores de insumos: o notável empreendedorismos dos homens do setor. O maior exemplo é a extraordinária expansão das fronteiras agrícolas nos últimos 20 ou 25 anos, quando produtores do Sul descobriram o Centro-Oeste, depois várias localidades do interior do Nordeste – a região de Barreiras, na Bahia, por exemplo – e agora as bordas da região amazônica.
Mas, estamos falando de um empreendedorismo de face anárquica, no sentido filosófico do termo, como é natural, aliás, que sejam Empreendedores. Normalmente não olham para o conjunto da atividade e não são muito sensíveis aos apelos de longo prazer – e o marketing rural só pode produzir resultados, tanto mais de criação de uma marca internacional, no longo prazo.
Além disso, empreendedores como os que vemos vicejar no agronegócio não são especialmente apegados a entidades de classe, por onde seria mais natural e eficiente que se desenvolvesse trabalhos deste tipo.

MG: Ou seja, uma das virtudes do agronegócio no Brasil é também um poderoso inimigo do marketing rural?
Tejon: Exatamente. Esta expansão tão rápida da atividade se deve a este espírito indômito do agricultor brasileiro. É pedir um pouco demais dele que, além de largar as fronteiras agrícolas, também se detenha numa tarefa tão oposta a esta que é desenvolver o marketing da sua atividade. Mas é inevitável que isso aconteça em prazo maiores.

MG: Certamente existem exceções à regra. Quais são elas?
Tejon: Não é por acaso que uma das melhores notícias do marketing rural dos últimos anos venha exatamente do trabalho desenvolvido pela Associação dos Criadores de Nelore. O mal da vaca louca talvez seja o diretor de marketing desta campanha, despertando a atenção dos produtores de gado nelore de todo o Brasil para a importância de terem uma imagem no exterior que corresponda à qualidade do rebanho brasileiro criado em pasto aberto e não em confinamento, como o gado europeu e boa parte dos Estados Unidos, numa condição ecológica e de saúde do rebanho muito mais propiciais e, às quais, há um mar de consumidores sensíveis. Mas, não deve ser um acidente sanitário que force as fronteiras do marketing rural.

MG: Assim, o avanço do marketing rural passa pelas associações de classe?
Tejon: Sem dúvida que sim, mas há outros caminhos também. Pode ser por meio de uma cooperativa ou de uma entidade de caráter regional, capaz de estimular o desenvolvimento de clusters. Entidades deste tipo, por exemplo, somam à atividade agrícola o turismo pela região. É o que acontece na Serra Gaúcha, por exemplo, onde o turismo assume um papel importante na geração de renda ao lado de várias atividades de agronegócio. Por lá está se seguindo o exemplo de várias regiões européias, como Champanhe, na França, e a Toscania na Itália, que partiram de uma atividade de natureza agrícola para atrair turistas, comércio e serviço, multiplicando riquezas e oportunidades de crescimento.

MG: Os empreendedores acabarão por se render ao marketing rural?
Tejon: Considero inevitável que façam sob o risco de se tornarem produtores de commodities condenados a se verem com margens cada vez mais comprimidas e sujeitas à concorrência absolutamente fora do seu controle.
É inevitável que o empresário sério e comprometido com a longevidade dos seus negócios pense em orquestrar esforços e buscar ampliar seus horizontes de ganho. E isso só pode ser conquistado com o marketing. Sem marketing não há valor, sem marketing você vai virar alvo fácil para os elos mais poderosos da cadeia agrícola.

MG: O produtor já percebeu a importância do marketing rural?
Tejon: Creio que grande parte já percebeu o valor que a atividade é capaz de agregar ao seu negócio e o quanto isso significa em termos de rentabilidade.

MG: Como o senhor definiria marketing para um produtor ainda não sintonizado com atividade?
Tejon: O que é o marketing, caro produtor? Indo direto à fonte é arte mental. Significa o raciocínio, a inteligência, o respeito e a importância real que você dá ao seu negócio sob o ponto de vista das mentes dos consumidores, do que percebem e do que não percebem. Significa descobrir verdades mentais, Significa descobrir verdades ainda não descobertas. E isso vale tanto para os canis de venda, quanto para os consumidores, para os nutricionistas, donos de restaurantes ou para os cientistas que antecedem a criação de pacotes tecnológicos.

MG: Há uma receita para acelerar o processo de fortalecimento do marketing rural?
Tejon: Naturalmente, cada caso é um caso, Faz muita diferença você falar de um segmento com muitos produtores e de outro, mais concentrado. É claro que culturas mais maduras e com menos dispersão geográfica têm maiores facilidades para se agrupar.
Também conta a vocação exportadora do segmento. O contato com o exterior geralmente força a organização para a busca de apoio do governo federal, entidades regulatórias, etc. Daí ao marketing, é um passo.

MG: Cumprida a etapa da reunião dos produtores, o que fazer a seguir?
Tejon: Não há segredos. É um trabalho, como já vimos, de longo prazo. Marketing não tem tradução; tem ação.
Não precisa apenas de dinheiro; precisa de atitude e muita pesquisa e investigação.
Na prática, marketing significa que você produtor e sua associação, sua cooperativa etc. conheçam, visitem, conversem com os dirigentes das organizações que compram os seus produtos. Significa que você deve se sentar à mesa para debater investimentos em pesquisas científicas dos seus maiores fornecedores, com seu técnico, com seu geneticista, pois sabemos que, no agronegócio é o pacote genético/tecnológico que decide o seu grau de competitividade. Marketing é proteger as cooperativas e a diferenciação das produções regionais; marketing é auditar balanços e acompanhar as decisões do seu integrador dentro do agrossetor, de forma a se prevenir e se colocar a salvo, na medida do possível, dos inevitáveis problemas advindos dos elos da cadeia fora da porteira dos produtores.

MG: O senhor foi um dos responsáveis pelo primeiro grande surto de desenvolvimento do marketing rural no Brasil, no começo dos anos 80, quando era diretor da Agroceres e presidente da Associação Brasileira de Marketing Rural. Que lembranças têm daquela ação e quais os resultados que ela produziu?
Tejon: Foi um trabalho pioneiro, produto da crença da Agroceres, na Figura do seu fundador. Ney Bittencourt de Araujo, na força do marketing rural complementado pela parceria com a Rede Globo, que compreendeu a importância daquela ação apoiando-a de forma diferenciada.
Foram cinco anos de trabalho a partir de 1983, visando principalmente os produtores de milho. Dentro das suas possibilidades, esta revista também ajudou.

MG: De que forma o senhor, como presidente da Associação de Marketing Rural e Agronegócios pretende se engatar nesta luta?
Tejon: Como tarefas, nossas bandeiras básicas são programas de desenvolvimento do marketing para o produtor rural e a realização de um programa de pesquisas sobre a marca Brasil no exterior, em parceria com o Ministério da Agricultura.
O fato de a pasta ser ocupada por Roberto Rodrigues é uma grande ajuda, pois se trata de um homem totalmente sintonizado e comprometido com as bandeiras do marketing rural.
Do ponto de vista de espírito, queremos espalhar a crença de que marketing é continuarmos com a nossa mente fogosa e competitiva. O Brasil precisa manter a sua competência de escala e logística, que o levaram à liderança em várias culturas do mundo. É preciso encontrar a alma e a arte do bom marketing.

36,5%: É quanto devem crescer as exportações Brasileiras de produtos agrícolas em 2004 em relação a 2003

US$ 1,5 Bilhão
Foi quanto somaram as exportações de carnes bovinas brasileiras. Em 2003 antes US$ + 36 milhões em 1997.

Fonte: Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócios